Assim, em retrospetiva, qual a avaliação que podemos fazer dos últimos milénios? Não nos tornámos na força dominante no Planeta Azul? Não atingimos um patamar em que rivalizamos com o que de mais forte a Natureza produz? Não moldámos a face da Terra às nossas ideias e sonhos? Não movemos montanhas, abrimos canais, dividimos continentes com um ímpeto que só a tectónica de placas consegue igualar? Não extinguimos espécies que não nos serviam - ou o faziam numa exagerada impavidez, que acabou por daná-las irrecuperavelmente -, não abatemos florestas inteiras apenas para nos estabelecermos?
Tudo isto - e muito mais - foi a obra que nos foi legada por escassos milénios de Humanidade. De lindíssimas obras-primas, como David ou a Gioconda, a portentosos livros, do calibre da Bíblia ou da Odisseia, passando por peças como Hamlet, sinfonias como a nona ou invenções como o telefone ou a roda, a genialidade do Homem trouxe-nos aos píncaros da Civilização, ao zénite do domínio do Mundo Natural. A um ritmo vertiginoso, ultrapassamo-nos de ano para ano, de mês para mês ou mesmo de semana para semana, confiando eu, aliás, que os nossos netos ou bisnetos terão de nós a noção e os preconceitos que nós destinamos aos Bárbaros Germanos que, no século V, levaram à queda dos brilhantes romanos. Os próximos 100 anos decerto comprimirão mais descobertas, avanços e conquistas que o último milénio e meio. No futuro, o desafio não será descobrir e inovar, mas conseguir triar eficazmente as intermináveis - e por vezes falaciosas - informações e saberes que nos chegarão.
Mais do que maldizer o presente e soltar maus augúrios sobre o futuro, há que manter a capacidade crítica, não desmobilizar à primeira visão de eventual turbulência no horizonte e, acima de tudo, orgulharmo-nos do nosso percurso. Não só individual - de que creio cada um ser responsável, como diria o Generalíssimo Franco, e eu agora parafraseio, perante Deus, caso nele acredite -, a sua consciência e, a História - mas principalmente coletivo.
Como podemos desmotivamo-nos perante o aquecimento global quando, com infinitamente menos recursos, colonizámos o planeta com um ímpeto jamais visto? Como podemos recear flagelos futuros, como a obesidade ou a diabetes, quando conseguimos erradicar diversas outras com programas multinacionais de vacinação e melhores condições sanitárias? Como nos podemos amedrontar face a problemas de dívida, défice ou contas públicas, quando descobrimos o nosso Sistema Planetário, a nossa Galáxia e o restante Universo no tempo de vida de uma sequóia?
O que importa é sonhar. Após possuirmos essa capacidade, tudo o resto é acessório. Tudo o mais não passa de uma ferramenta. Toda a nossa existência se simplifica. Todo o futuro parecerá melhor.
Miguel Padrão