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Inclusão, comunicação, pensamento crítico, individualização, autonomia, colaboração, inovação e criatividade são, entre outros, conceitos inspiradores de práticas de aprendizagens em contexto de sala de aula que colocam aluno e professor na rota da descoberta de saberes e competências. Estiveram presentes na ação de formação “Autonomia e Flexibilidade Curricular como oportunidade de construção de uma Escola mais inclusiva”, realizada entre 5 e 9 de fevereiro, juntando dirigentes, professores e encarregados de educação da Escola Portuguesa de Moçambique – Centro de Ensino e Língua Portuguesa (EPM-CELP), dinamizada pela professora e investigadora portuguesa Ariana Cosme, da Universidade do Porto (UP), de Portugal, que partilhou problemas e soluções do mundo contemporâneo da educação.

Na sessão reservada aos diretores de turma dos segundo e terceiro ciclos do ensino básico e do ensino secundário, Ariana Cosme afirmou que é preciso uma readaptação às novas exigências da escola atual, passando pela modificação de formas de ensinar, da organização enfileirada de alunos na sala de aula, das “aulas palestras” que visam simplesmente fornecer informação aos estudantes, do individualismo e da falta de diálogo crítico durante as lições de estudo. Na área da avaliação das aprendizagens, tema bastante debatido, Ariana Cosme, doutorada em Ciências da Educação, defendeu, entre outras medidas, a simplificação dos métodos de ensino, a fusão de disciplinas, o fim ou a racionalização dos testes escritos e a estimulação do pensamento crítico e da atitude colaborativa e de partilha entre os estudantes para serem capazes de resolver os vários tipos de problemas colocados pelo quotidiano. A investigadora, citando o matemático português Sebastião e Silva (1914-1972), disse ser necessário desvirtuar “um sistema educacional que não ensina a observar, nem a experimentar, nem a refletir, nem a raciocinar, nem a escrever, nem a falar: ensina apenas a refletir mecanicamente”.

Ariana Cosme, que é consultora do projeto em curso nas escolas portuguesas de Autonomia e Flexibilidade Curricular a convite do Ministério da Educação de Portugal, assegurou que “as avaliações de aprendizagens não chegam, em geral, a conclusões definitivas” e que os resultados dos alunos no fim de cada período ou ano, fixados em pauta, refletem o trabalho do professor, ilustrando que “uma pauta com 15 reprovações revela a fraca capacidade do professor em lidar com as adversidades e diferenças na sala de aula”, pois, justificou, a natureza e objetivo da avaliação “é, para além de verificar e medir, melhorar a prestação dos alunos”.

“Como se de máquinas se tratassem”

web ariana.cosme fev19A professora da UP alertou para a necessidade de a escola respeitar o capital cultural dos estudantes, rejeitando a ideia de todos os alunos receberem o mesmo tratamento ou matérias idênticas para estudo na sala de aula comum “como se de máquinas se tratassem”, ilustrando: “imaginem o caos que seria se o médico diagnosticasse a mesma doença a todos!”

Na análise de Ariana Cosme, o interesse dos alunos pela escola manifesta-se à imagem de uma pirâmide, diminuindo em direção ao vértice, ou seja, aos últimos anos da escolaridade básica. Este comportamento deve-se parcialmente, tal como explicou a formadora, à exclusão e normalização dos talentos no meio escolar, que também tende a ignorar o capital cultural de muitos alunos, situação que as maiores taxas de abandono escolar no ensino secundário parecem refletir. Genericamente, para Ariana Cosme, de entre os maiores desafios da mudança da educação atual perfilam-se o questionamento das práticas vigentes, a disponibilização de ferramentas pedagógicas ativas e dinâmicas, a avaliação do papel dos testes escritos na vida dos alunos, a fusão de disciplinas e o envolvimento dos alunos nos processos de decisão.

Francisco Carvalho, subdiretor para a área pedagógica na EPM-CELP, referiu que a formação teve a virtude de ter sido ministrada por uma das mentoras do projeto de autonomia e flexibilidade curricular e respetivo diploma legal, sublinhando ser alguém “que compreende muito bem quais sãos os princípios desta legislação e qual a filosofia que está por detrás” e salientando que “a ação de formação permitiu que todas as pessoas percebessem qual a lógica do decreto-lei, com o qual estamos de acordo e, tal como a formadora afirmou, já fizemos um caminho nesse sentido”. Para o contexto de sala de aulas, o subdiretor avançou a ideia de que as mudanças impostas pela nova legislação trazem alguma exigência, implicando que “os professores tenham uma atitude mais dinâmica, muito mais virada para o aluno e para as suas aprendizagens do aluno do que propriamente para o programa”, declarou.

“Temos condições para avançar”

web flexibilidade.curricular1 fev19A avaliação das aprendizagens, tema particularizado na ação de formação, mereceu de Luísa Antunes, diretora do Centro de Formação e Difusão da Língua Portuguesa, responsável da iniciativa, a consideração de que exige uma diversificação de instrumentos de avaliação, tal como defendido por Ariana Cosme. “É verdade que o corpo docente ainda atribui um peso excessivo aos testes escritos e, muitas vezes, as próprias famílias dos alunos querem saber a nota quantitativa do teste. Porém, o projeto de Autonomia e Flexibilidade Curricular pretende que os alunos atinjam as competências essenciais, que tenham um conhecimento holístico e não focado apenas na Matemática, Português ou História, mas sim que disponham de ferramentas que lhes permitam ter espírito crítico e de iniciativa, bem como trabalho em equipa, mais do que apropriação exclusiva de um conteúdo cientifico da disciplina A ou B”, explicou Luísa Antunes.

Tal como anunciado nos objetivos, a ação de formação criou espaço para os formandos refletirem sobre mudanças que o projeto de autonomia e flexibilidade curricular vai trazer à nossa Escola. Finda a ação, Luísa Antunes espera que os professores “abracem o projeto, que é desafiante, que vai trazer alguns constrangimentos, mas acredito que nós temos condições para avançar”.

A ação de formação “Autonomia e Flexibilidade Curricular como oportunidade de construção de uma Escola Inclusiva” foi destinada aos professores do primeiro ciclo do ensino básico, da Educação Especial, diretores de turma dos segundo e terceiro ciclos e do ensino secundário, coordenadores pedagógicos de ciclos, coordenadores de departamentos curriculares, representantes de áreas disciplinares, membros da Direção e, ainda, encarregados de educação.

Notas biográficas sobre Ariana Cosme
Ariana Cosme é professora da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação na Universidade do Porto (Portugal), onde coordena (em colaboração) o Observatório de Vida das Escolas integradas no CIIE (Centro de Investigação e Intervenção Educativas). Doutorada em Ciências da Educação pela Universidade do Porto, fez um pós-doutoramento na área da formação de professores na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Brasil, onde é professora visitante.

Autora de obras académicas que se debruçam sobre a problemática da mediação educativa e pedagógica e a reconfiguração da profissão docente, Ariana Cosme desenvolve esta reflexão sobretudo no domínio do ensino básico e secundário, o que justifica a intervenção que tem vindo a desenvolver como formadora e consultora de escolas inseridas em Territórios Socialmente Vulneráveis e em Projetos de Inovação Pedagógica.

É consultora do PAFC - Projeto Piloto de Autonomia e Flexibilidade Curricular -, a convite do Ministério da Educação de Portugal.

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