
Quem sabe muito me engano
Mas pouco mais há a dizer
PÓ, pó somente, exclamo
Já nem mesmo isso há a perder
Pó, triste ruína fumegante
Afinal, que mais tentar?
Se sequer o vento soante
Do deserto nas ruínas silvar
Como silvaria, se das pedras
Nem restam as visões calmas
Como poderemos, se não medras
OH, cultura, nas nossas almas!?
Se pelo petróleo, pelo capital
em sangue se esvai o ocidente
Porque não por ti, princesa
Do mar ingente Uma gota derramar?
Porque te votamos Rainha
À apagada névoa do passar
Como podemos, senhora minha
A tal tormento vos votar?
E cair, aos símios retornar
No brutal estado de Pensar
Que só Godos, Hunos, Timúridas
Gentes pútridas poderia orgulhar?
Perde-se a história, mas mais há a lamentar Não só ruínas, tijolos ou lajes a chorar É toda a Roma, o Maré Nostrum que berra É a civilização a desmoronar
Quando todos impavidamos
E assistimos com prazer
A tais barbáries que nem anos
Nem atos jamais poderão desfazer
Não só mau, hipócrita, criminoso,
Triste será olhar
Deixa-nos também tal pouso
Pouco orgulho para legar
Só fumo, cinzas e pó,
Oh pó, pó que o meu olhar
Mistura com as areias, e o deserto
Engole sem jamais vomitar
- A Zenóbia, a mais recente e antiga, célebre e esquecida refugiada da Guerra Civil Síria -
Miguel Padrão
