Amava a minha casa, era bem decorada, com móveis, cortinados, carpetes e cadeiras. O que há nas casas todas. Entrei no meu quarto e deitei-me. Lençóis verdes de flanela, fofos, quentes, que faziam lembrar a erva morena do parque por onde eu passava todos os dias de bicicleta.
Não resisti a um belo sono para refrescar a cabeça depois de um longo dia de trabalho na escola. Trabalhava como psicólogo. Deitei então a minha cabeça cheia e pesada na almofada de penas que fez aquele barulho aconchegante. Adormeci.
Acordei à noite perto das vinte e uma horas exaltado por um cheiro doce, um cheiro bom, um cheiro a jantar. Era o cheiro a bacalhau à Brás, daqueles molezinhos, bem feitos. Segui o cheiro até à janela, e lá estava a minha vizinha no prédio da frente, dois andares abaixo a preparar o jantar. Não tinha jantar preparado. Ela morava sozinha, era de estatura média, mais velha do que eu. Já a conhecia do trabalho. Olhou para mim com aqueles olhos castanhos-claros lindos e chamou-me educadamente. A planta da casa dela era igual à minha, mas com um grande teor de cores mais alegres.
E vocês perguntam: "Como é que correu o jantar?". E eu digo que estou agora a escrever este texto com ela, vivo numa casa branca nova, perto da antiga e vou buscar os nossos filhos à escola dentro de minutos.
Manuel Pessoa (9.º B)