
Navega uma nau abandonada
sem rumo certo, ensalitrada
penosamente se arrasta à deriva
A bordo segue, lívido e ressequido
mor, solenemente enfaixado
um esperançoso convertido
desolado incensador do Passado
Terr'à vista, terra Crente
Grita o gageiro nela vidrado
Mas já se finou o lívido acamado
Soltando um breve olhar plangente
Quem de su'alma cuidará?
Que lágrima por ele escorrerá?
Que companhia o poderá velar
Salvo vós, peixes d'alto mar?
Deu-lhe uma apoplexia
dirão todos sem crer
quanta leda, sã ataraxia
daquela face tendia a escorrer
Pobre sonhador vão
que nas revoltas águas flutua
Pobre alma esperançosa, pura
que de estocada perdeu o coração
Não mais verá terra ou pisará
os brancos campos natais
jamais deambulará ao Deus d'ará
nem verá filhos, parentes, pais
Parte só, deixa a saudade
do distante passado irrepetível
de dias inundados da bondade
que só aos justos é possível
Será o mar sua eterna tumba
numa salgada imensidão
que, se a sua pureza não afunda
nas águas se dissove a canção
de puro pesar, nostalgia
de nojo desencantado
mais que choro de amor, simpatia,
hino a um companheiro tombado
Miguel Padrão (11.º A1)
